O prefeito do Recife, João Campos, acaba de ser sacramentado presidente do PSB, no último dia do congresso do partido, em Brasília, neste domingo (1º). É o marco histórico de sua largada nacional.
A partir de agora, ele toma assento na sala de estar da política nacional, o que projeta suas ações para fora dos muros de Pernambuco.
O lugar é privilegiado, por isso cobiçado por tantos. Cada um que o frequenta, acalenta seus sonhos, e trabalha para realizá-los. Miguel Arraes fez parte desta sala. O golpe militar de 1964 atrapalhou sua jornada. Eduardo Campos também esteve lá – com ele, a interrupção foi causada por uma tragédia.
Agora, chega João, bisneto do primeiro, filho do segundo.
Deve chamar muita atenção nos primeiros momentos. Uma cara nova em um universo de rostos conhecidos.
Passará pelo escrutínio da mídia, que vive de novidades e costuma primeiro incensar os que estão chegando para, logo depois, correr atrás de histórias (escândalos, denúncias, fraudes…) capazes de revelar que os pés do recém-chegado são de barro. Faz parte do jogo. Eduardo – que viveu essa caçada antropofágica – conhecia o processo muito bem.
João vivenciará também, na prática, o que na teoria já sabe: que não é fácil para um nome da política do Nordeste tornar-se competitivo e aceito nacionalmente. Arraes passou por isso na fase pré-golpe militar. Nas últimas décadas, só dois nomes conseguiram criar condições para tentar avançar: Ciro Gomes (CE), cujo temperamento o empurrou para caminhos cada vez mais tortuosos, e Eduardo.
O prefeito do Recife terá de construir um discurso que faça sentido tanto para quem vive em Petrolina (PE) quanto para quem está no Alegrete (RS).
E precisará ganhar a confiança do mercado, este ser de poderes imensos que a gente sequer tem o direito de ver a cara.
IMEDIATOS
Estes, porém, são desafios de médio e longo prazo. O que exige urgência é o desafio imediato – ou, como dizia Ulysses Guimarães para políticos jovens, “a cada dia, sua agonia”.
Para João, o imediato é ganhar a eleição para governador, em 2026. As pesquisas o dão como favorito, mas o jogo mal começou.
Uma vitória lhe dará mais espaço na sala de estar da política nacional. A agonia de cada dia, no entanto, não cessa aí. Seguirá com a necessidade de fazer um governo muito bom e diferenciado.
Com um presidente da República como adversário, é praticamente impossível atingir tal meta. Com um presidente aliado, as chances aumentam muito. E com um presidente aliado e amigo, aí então…
Fala-se que a trajetória de João pode ocupar o vazio do pós-Lula, mas vejam que a jornada de ambos tem um forte momento de intersecção. Com repercussão sobre a relação PSB-PT.
Depois da própria vitória para governador, não há nada mais importante para João Campos do que a reeleição de Lula.
RENOVAÇÃO
Arraes foi deputado estadual, prefeito do Recife e governador com 46 anos. Eduardo Campos foi deputado federal, ministro e chegou ao governo de Pernambuco com 41 anos. João foi deputado federal, está prefeito e, se eleito governador em 2026, chegará lá com 32 anos. Novos tempos.
João, neste momento de sua largada nacional, vem embalado na onda da renovação. Uma característica favorável por uma longa lista de motivos – entre outros, por ser algo difícil de encontrar no chamado campo progressista. O PT venceu 5 eleições presidenciais, tem o maior líder político do país – mas não conseguiu renovar suas lideranças. As caras novas da política surgiram mais no campo da extrema direita.
A falta de renovação se faz sentir também no discurso – da primeira eleição do Lula, em 2002, até agora passaram-se mais de 20 anos. Há uma série de demandas novas, que não tiveram ainda a devida acolhida no campo progressista.
João Campos pode ser a porta aberta para essas demandas.
Outro ponto importante, que ele destacou nestes dias do congresso do PSB, é o da necessidade de reconexão com o centro – que hoje, quem diria, foi parar no território do extremismo bolsonarista.
O centro (não confundir com Centrão) é particularmente sensível a determinados temas, e bater-lhe a porta na cara não costuma ser boa política. Tê-lo como aliado é importante para ganhar eleição e para governar.
Atentem vocês para o fato de que de 1998 a 2014 a extrema-direita não aparecia nas eleições presidenciais sequer com candidatos folclóricos. E, antes disso, a própria direita se compôs com candidatos como Fernando Henrique Cardoso – um progressista. Quando Lula chegou ao final do seu segundo mandato, as pesquisas lhe davam mais de 80% de aprovação.
Cadê o centro que estava aqui? O gato da extrema direita comeu.
Enfim, João Campos está vindo aí. A julgar pelo que vem dizendo, parece ver com nitidez o lugar que deseja ocupar. Tem muito chão a percorrer, e o caminho não deverá ser tão pavimentado como costuma ser no início de caminhada.
Outros tentaram. Agora é a vez dele.